CRÔNICAS DE VIOLÊNCIA

De repente, um repente de violência.




   Adriana, casada há dois anos e já com seu primeiro filho, de menos de um ano, tenta conviver bem com seu esposo Miguel. Moram num pequeno sitio do sertão pernambucano. Ambos vivem do que plantam: milho e feijão, quando a chuva contribui.

   Miguel é um bom esposo, preocupado e atencioso, com o filho e com Ana, mas, quando bebe, muda sua personalidade.

   Certo dia, em comemoração a colheita de junho, a comunidade do lugarejo decidiu fazer uma “cantoria”. Uma festa onde os repentistas pudessem disputar suas rimas. Ana e Miguel saíram animados e foram ao pequeno barzinho, simples, com algumas lâmpadas espalhadas no meio do “terreiro”. Sentam-se num bom lugar onde pudessem ouvir os artistas e conversarem com os seus vizinhos.

   Ali, aparentemente, representa um lugar de alegria e animação mas, antes que Ana pudesse perceber, Miguel se empolga com a bebida e começa a ficar diferente. Já não olha para ela da mesma forma; olha como se estivesse vendo algo de errado. Ana está impaciente, pois deixou seu filhinho com os sogros, mas, sabe que ele pode acordar e sentir a sua falta.

   O tempo passa e Ana fica mais impaciente. Calada, ela já não tem mais vontade de conversar com as mulheres que estão seu lado e observa Miguel. Rindo, conversando com os amigos. Vários são os assuntos que surgem. Até que, um morador da localidade se aproxima do repentista e fala algo ao seu ouvido. Prontamente, ele começa um verso que fala sobre o homem que bate na mulher e diz que, homem que é homem, não bate em mulher nem com uma flor. Ana sabia que era com ela, pois de muitas outras ocasiões, os visinhos sabiam que ela passava por este problema.

   Miguel, de tão bêbado, percebe apenas que o autor do versinho olhou para Ana. Acompanhando, com o olhar, a direção em que o pedinte havia observado ao solicitar a poesia. Isso foi, a razão, para a infelicidade completa de Ana. Miguel sente necessidade de sair do local e pega com força em seu braço. Aos berros e empurrões Ana é levada para casa.

   Acorda seus sogros pedindo ajuda, batendo na porta, estes atendem seu pedido e tentam intervir na discussão. Miguel grita que Ana estava paquerando o cantor, pergunta se ela não tem vergonha e seus sogros lhe olham de forma repreendedora. Alucinado aperta seu pescoço e lhe empurra em direção a parede. Com força lhe dá tapas e ela, com medo dele pegar algum objeto pois, estavam na cozinha e decide correr para o mato. Esconde-se atrás do galinheiro e escuta os gritos de Miguel. Fica extremamente preocupada com seu bebê, que ainda estava dormindo, mas, esta teme que ele se acorde, chore e que seu marido incomodado com o choro lhe faça algo.

   Algum tempo depois, os gritos diminuem. Ela ouve apenas que Miguel, no banheiro, vomita. Ela sabe que isso é um bom sinal. Aos poucos ela volta e olha pela fresta da janela, sua sogra ao lado do seu filhinho, rezando. Percebe que as coisas estão voltando, os poucos, ao normal.

   Miguel, sai do banheiro e se deita na cama. Ela se aproxima da casa, e seu sogro lhe pede que espere até que ele durma. Dormiu. Enfim, pois está quase amanhecendo, e Ana, depois de um dia de mãe, agricultora e dona de casa, pode enfim se recolher. Deita, devagar, para não acordá-lo e chora baixinho. Ao amanhecer, seu filho chora e Ana recomeça sua luta. Miguel, muito tempo depois acorda. De cara feia, não lhe dá nem bom dia e diz que se gosta dele tem que aceitá-lo do jeito que ele é. Ana tenta conversar, mais é inútil.

   Sua cabeça sabe que isto não pode continuar, mas como sair daquela situação? Para onde ir? Como dizer a sua mãe e avó, pois foi criada sem pai, que aquele homem, que escolheu para esposo fazia isto? Como criar seu filho? Dar mais um, para elas criarem não seria justo. Assim, Ana apenas rezou, e com a fé, que, como todos os nordestinos possuem, acredita que ele vai mudar.


AUTORA: Rita Jussara


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